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Sem nenhuma âncora de segurança velejo em primaveras mortas. Velejo em águas paradas onde me reconheço nos corpos que apodrecem na superfície. É nítido que a festa acabou. Miro a Lua que tanto desejo. Penso: "É tudo inútil". Grande atriz chora toda a noite antes dormir. Acorda soluçando de pavor. Veleja aos poucos nos cabelos negros da morte. Esse medo de se sentir afastado. A espera de um encontro. Ou daquele velho retorno, a primeira lembrança. O que quer dizer? Viajo sem porto inventando tristeza pra saber como que é o contrário. Ela, com seus oitenta anos de bons dias e boas noites, percebe os seus morrendo a cada estação. Nem ela tem âncora.
2
Estudei meu papel no reino da imaginação. Assediado pela curiosidade tentei entrar em inúmeras vidas. Sim. Fui tentando chegar o mais perto do para sempre.Do Encontro. Usei a ação como veículo, como minha âncora. E mesmo assim sigo com os pés na sujeira. Esfregando a cara na merda enquanto meu corpo se acorda. E aguardo, depois de tudo, no meio de um cigarro a outro, poder dizer Adeus antes de enfiar uma faca na jugular. Devolver meu sangue ao mundo enquanto o vento passa pela praça. E vou inventando crendices para tentar esquecer a mão vazia. Para enganar o medo que tenho do Sol. Para esquecer que o tempo destrói tudo. E que não veremos mais nada. Só restará uma canto triste murmurado enquanto faço uma ação cotidiana qualquer. Como sonhar...
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Depois de tantas confusões, para buscar a compreensão, encontrarei um lugar. Entre ratos, esgotos abertos, haverá gritos de violência, palavras feias e onomatopeias de ódio, gemidos, sangue, muito cachaça, eu andaria como no meio de uma praia branca. Absolvendo todos e depois pedirei ajuda para entrar no mar. Eles me olhariam de canto de olho, com resto de comida encontrado no lixo nos seus dentes, unhas sujas, corpo sexualmente ativo e reprimido, com sua pele podre pronta pra ser fritada, iriam rir e me pedir dinheiro. Me disponibilizariam seus órgãos sexuais se eu quisesse. Não gastaria nada. Me sujeitaria beijar aquelas bocas de dentes podres? Brincar de gonorréia? Virar um deles? Os culpados da sociedade. Os invisíveis fedidos. A prova viva do fracasso. Do nosso fracasso. Do meu. Somos todos patéticos. Eu sou patético o suficiente para pedir que tenham dó. Tenham dó! Sejamos Deuses e Diabos! O resto é linguiça. E meus irmãos daqui, comem linguiça crua mesmo! Outros enfiam no cu!
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De repente tudo se desfaz. Me torno louco em dois segundos. Não me importo com mais nada. Nem do vento e nem da chama. Se quiser de planos. E mesmo assim, entre o drama criado, sem eu ter feito nada, no meio do meu nada, que nada é, alguém me pede para falar qual é o caminho. Não sei. Molhado, até os ossos, de tristeza eu saio. Velejo um pouco mais. Quais são as águas?