terça-feira, 12 de junho de 2012

Correnteza


Era uma correnteza linda!
Mude o seu coração e tente entender. Tente entender como um por do sol.
A água limpa. Corrente. Pequenos insetos pousados entre folhas verdes e flores de árvores altas. Uma leve brisa com doce de amor. Um dia todos entenderão isto.
Uma correnteza linda.
Silenciosa e atenta. Disposta a um banho gelado entrando no mais profundo da pele. A água limpa entre ossos e cartilagens. Entre buques de sonhos e inocência.
Cores. Uma transa com a Lua. Tocando a Lua! Lindo. Sim.
Uma correnteza que a cada passo mudava de lugar.
Cada gota como uma imensidão do mar num olhar que não alcança o horizonte.

E de repente, como no poema, bem de repente, a água se transforma em diesel.
O cheiro a degradação consome os insetos e os ossos.
O mais profundo da pele se torna desconhecido.
A morte a trinta dias.
As armas são recolhidas, é necessário estar armado agora. Proteção.
Quem diria! Proteção de todos. Dos amigos principalmente.
Começo e fim.
Agora não precisa entender. Não é necessário mudar o coração, este já está podre.
Impregnado de toxinas.
Dentes cinzas. Sol negro. A água vermelha despejada aos pés da margem destruída.
A respiração ofegante é o único indício de vida da correnteza.

A raiva predomina.
Mordo a mesa da sala. Meus filhos estão mortos. Heróis na tampa de margarina.
As flores estão intocáveis no alto de escassas nuvens de chuva. É a era da seca. A era do quarto fechado e da narrativa verborrágica.
A correnteza segue sem perspectivas.
O Caminho é terra. Não há grama.
Tolos em cadeiras com rodas. Cansaço. Idiotas dançam ao som do fim do mundo.
O rosto afunilado em direção aos arranha-céus contrastando com as unhas negras e calos.
Mais uns trocados jogados pela janela.
O mundo entre aspas.
É fim do dia. Ou quatro horas.
Há forma para adaptação nessa teia?
O resto do troco, quase nada, para o trampolim sobre o nirvana.
Poesia de classe morta.
São todas essas bobagens que eu digo e repito e guardo.

A correnteza na minha boca.
Bocejo prevendo eterno sono.
Eu negando minha própria ligação.
O chiclete na boca para manter o bom hálito.
Para manter, nem que seja por pouco tempo, a respiração artificialmente fresca.

Por isso, não leve a sério os segredos.
Não abra a porta se baterem.
Esqueça as flores, esqueça de contar de olhos fechados antes do pulo.

Esqueça.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Sombra

Qualquer esforço será em vão. Toda tentativa resvala para a cova do fracasso. O que nos resta é este cansaço. Este desconforto. Essa vontade de explodir de alguma forma: gritando, chutando, apanhando, chorando, sangrando, cortando, esmurrando, urrando, gozando, gozando, gozando... gozando.

O que fazemos é manter a respiração em dia. O sangue limpo. Ingerir a quantidade certa de fibras para poder cagar em paz. Tomar água. E depois? E antes? Antes é pior.

Aquilo que sou é uma sombra. Sombra de algo que não sei o que é, mas acredito ser muito mais escuro do que aparento ser. Essa escuridão está relacionada a ausência de luz nos olhos da razão. A razão é um verme instalado, com residência fixa, tv a cabo e tudo, dentro de nossos cérebros. Essa massa roxa que pesa não sei quantos quilos e que não consegue descansar um só segundo em tudo isso chamado de vida.

Essa descontinuidade às vezes me perturba de tal maneira que às vezes penso em dar um fim à esse fio de vida que me segura aqui diante desse nada. Às vezes, quando ando na rua, olho mendigos, crackeiros, idosos, decrépitos, pessoas obesas, pessoas com anomalias, todas as pessoas no final, e tento imaginar o que eles pensam. Me entristece esse exercício solo. Porém, há um certo prazer escondido nisto. Brincar de máscaras podres. Máscaras perdidas. Máscaras de dor. Muitos pensam: "Que dor é essa? Como chegarei até lá? Tomara que passe!" Ela não chega e nada passa. Outras: "Porque eu não acabo com isso de uma vez?" O suicídio é maravilhoso. O suicídio é uma corda onde as duas pontas - coragem e covardia - estão amarradas no mesmo nó que é enrolado no pescoço. Eu sigo jogando apenas.

Junho

O filho masturba-se.

A mãe chora.

O cachorro come qualquer animal que tenha ânus.

Haverá sempre um pobre para plantar as batatas de um rico.

Delete, a palavra mais usada e menos compreendida do século 21.

Mantenha as crianças longe dos produtos de limpeza.

Oswald de Andrade cagando num livro do Bukowski.

Agite antes de beber.

Válvulas.

Não reutilize uma camisinha.

Cuspa caso necessite de lubrificante para o ato sexual.

As flores eram bonitas até o Século 19.

O mais próximo de humanidade que já chegamos foi quando comemos o Bispo Sardinha.

Não reutilize uma camisinha.


Freud sonhando com o pai.

Cristo pelado.

22:22.

Lembrança a todas as crianças que morrem neste exato momento pelos seguintes motivos:
a) falta de água
b) fome
c) violência sexual
d) afogamento
e) ingestão de shampoo
f) preguiça
g)OBESIDADE

Lembrança aqueles que andam de jatinho de um lado ao outro.

Aos fins dos dias

A todas aquelas pessoas que se mataram e que não estão nas estatísticas.

Aquilo em que o mundo tem de melhor:
- prestação e comidas instantâneas

Aquilo em que o mundo tem de pior:
- tudo referente a formas de comunicação.

A toda porra jorrada para o lado da cama.

Casas carregadas pelo enchentes.

A água que corre pela fresta da mão.


MÉMA.