Aqui no banco desse ônibus o gosto que tenho na boca é de sangue. Sangue que transborda nas fendas de meus dentes. A língua vermelha se remexe numa bacia-boca de sangue e saliva. Hemácias ao estômago. Há algo necrosado no reino da dinamarca-ruas-de-pelotas. Há algo de necrosado dentro de mim.
Corpo insuficiente, conversas vagas e erotismo a todos os cantos. Deus-tempo implacável chicoteia a cada segundo. Suspiros de indecência e infelicidade em cada rosto que compõe a tal imagem pastosa. Trocados por vício! Trocados por segurança! Numa rua deserta o ônibus passa e alguém sente a paz pela primeira vez na vida fumando um cigarro em cima de um bueiro a firmamento aberto. Necrose e cia ilimitada pelas ruas. Páginas e mais páginas vagas de alguém que não poderá se esconder.
Aqui que eu paro. Desço do ônibus com o passo acelerado. Batimento acelerado - ninguém atende. Mãos ásperas procuram bolso certo, chave certa, segundo rápido para a segurança. Silêncio inexistente. Animais de rua comem lixo, animais de rua querem trocados, animais de rua pegam ônibus e correm assustados a sua toca-casa-inexistente.
É de sangue o gosto que a língua prova. Sangue e saliva. Cigarros em carreiras, fileirados em minutos, com doses hemopáticas de álcool. A necrose em palavras. Estou necrosando a cada dia. A palavra talvez me salva. O lugar sagrado, as palavras sábias, os entendimentos formais e acadêmicos são impuros. A necrose e cia. está começando. Não posso parar. Não de novo nunca.
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