domingo, 8 de janeiro de 2012

Contas - 1

O senhor estava sentado na frente da janela de sua janela. A paisagem daquele dia lembrava algum dia de outono, embora fosse inicio de verão. O vento forte levantava casacos que passavam pela rua. "Frio." Ele pensou rapidamente, fazendo um movimento com a língua entre os lábios. Estava com sede. Fazia alguns minutos que a enfermeira havia saído do quarto para pegar água. Ele gostaria de saber o nome dela, mas as palavras já não saem da sua boca. Muitos anos antes de conhecer ela. Acidente de carro que ele tenta apagar da memória, mas o corpo não deixa ele esquecer. O corpo não deixa passar nada.
O vento intensifica lá fora. O normal nessa época do ano é a seca. No interior os campos secam, plantações parecem desertos queimados pela luz do Sol, açudes secos e animais magros. Porém, o vento está mais forte. Previsão de chuva talvez. "O rádio poderia estar ligado." Outro pensamento que não terá retorno externo. Vento. Silêncios curtos entre os tics e tacs do relógio na parede. "Nunca irão concertar essa merda." De novo a porta se abre num sopetão. A enfermeira entra com a tigela verde limão com uma comida sem sal, sem gosto. Limpa a saliva que escorre queixo a baixo do senhor. Embora possuindo os movimentos do pescoço pra cima, ele não consegue controlar sempre a saliva produzida.
- Seu filho mais velho está na sala. Veio da cidade dele para falar contigo. Vou deixar a comida aqui, está muito quente. Depois eu volto.
Pouco interessava a temperatura daquela mistura que ela chamava de Co-mi-da. Preocupava o que sei filho queria dizer.

Nenhum comentário:

Postar um comentário