terça-feira, 10 de setembro de 2013

a xícara da sex shop

Uma xícara de café com leite cai no balcão de uma sex shop. O líquido cai pelo chão. É possível sentir o cheiro de vômito perto do pênis de 25cm. Na janela uma criança olha petrificada o balanço da xícara. O corpo que a derrubou está atrás do balcão. Inconsciente. Mais um morto na terra por ataque cardíaco. O homem de meia idade ficou irritado por uma mulher grávida de fetiches inúmeros ter vomitado perto do pênis de 25cm. Não podendo expressar sua raiva acumulada de anos pensou em tomar um café. A aceleração do coração fez ele bater com a cara no balcão. A criança entra dentro da loja. Pega uma vagina de borracha e um chicote e sai correndo. Outros entram e vão pegando outros objetos. A câmera de segurança filma tudo. A mulher grávida que estava no banheiro sai apreensiva. Já pedindo perdão. Até que encontro o morto. Chora. Um homem entra e pega o dinheiro da caixa registradora. Ela pede para não fazer isso. Ele dá um soco nela. Ela sangra. A xícara não quebrou.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

um revoltado no meio do lixo

Hoje fiquei surpreso ao ver o noticiário pela manhã. Uma família, em alguma cidade da grande São Paulo, foi encontrada morta em sua casa. Sem sinais de violência aparente. O pai estava na cama abraçado a sua filha de 3 anos e ao seu filho de 5. A mulher, mãe das crianças, estava deitada no beliche ao lado cama onde seus familiares foram encontrados. Os policiais não sabiam dizer como a família morreu, mas que tudo indicava que era venenamento. Os vizinhos diziam que eles saiam pela manhã e voltavam a noite. Todos os dias. Disseram também que era uma família muito quieta, que não interagia muito com os vizinhos. A última vez que foram vistos foi na sexta-feira a noite. O que me chamou a atenção foi o bilhete escrito pelo pai, com lápis de cor, encontrado na cozinha: "Não consegui cuidar de meus filhos!"
Para quem já leu "Quando as Máquinas Param" de Plínio Marcos, ou melhor, para quem já trabalhou com este texto e com a atmosfera desta peça, pode ter uma certa noção do que estou pensando. A minha atenção foi acionada primeiro pelo fato de como é mostrada as nossas redes de informação. Olhar o jornal é sentir o jogo econômico que tudo se tornou: te vendem comida, roupas, carros, casas, filmes usando como isca o sexo-pornográfico-fantasioso-pscicótico; os filmes norte-americanos atravessam as notícias numa propaganda e outra, ou simplesmente trocando de canal; as estatísticas de mortes, assaltos, roubos, desvios de dinheiro, acidentes de carros, engarrafamentos, só aumentam enquanto que a economia brasileira cresce e "está favorável para investimentos", e haja fila nos postos, balelas dos presidentes, e... e... por aí vai. Soube hoje que Haroldo de Campos falou: "Políticos? É fácil entendê-los, pois não são humanos. São cavalos que falam!" Está certo!
Hoje fui a um grande atacado aqui em Pelotas. Eram muitas pessoas lá dentro numa noite de segunda-feira. Muitas pessoas gordas se arrastando, empurrando seus enormes carrinhos repletos de doces e carboidratos. E elas comiam! Compravam e comiam ali mesmo. Se empurravam, se batiam, se encaravam, enchiam mais ainda seus carrinhos, enchiam mais ainda suas barrigas. Eu conseguia ver os produtos todos com pedaços de carne de pessoas que explodiram ali mesmo de tanto comer e de tanta angústia acumulada. A visão do inferno se completava na fila para pagar. Inútil Paisagem. Será que alguém percebia aquela quantidade de gente de cara sofrida, em uma outra fila para pagar outra coisa, gordos e gordas, pobres e cansados, endividados e tristes? Imaginei, como uma forma de brincadeira pessoal e sumir dali de alguma forma, que quando morrermos iremos parar numa fila de supermercado, com menos pessoas é claro, e passaremos no caixa. Alguém, com um carma pior do que o meu, passará uma máquina em mim e mostrará na tela tudo o que eu fiz e não fiz. Ela virará para mim e perguntará: "Como queres pagar?"
Voltando a notícia. Me surpreendeu o fato de que a MUVUCA do G20 ter chamado mais atenção que a história deste pai de família brasileiro. O que se passou na cabeça deste homem? Ele simplesmente envenenou toda a família. Não foi Medéia que matou-se e as crianças. Não foi só isso! Foi ele, a mulher e as crianças. O noticiário disse que haviam cortado a luz da casa deles a um mês. Outros dizem que eles passavam por uma crise financeira muito séria. Mas quem não passa? Enquanto os números da Petrobras crescem, enquanto nos tornamos a 6ª economia do mundo, enquanto o dólar cai pelo sexto dia seguido e no senado os políticos tiram os sapatos e brincam com seus dedões entre um cancelamento de voto de projeto e outro, inúmeras pessoas no Brasil se submetem a trabalhos ou pré-trabalhos para poder sobreviver.
"Não consegui cuidar de meus filhos!" é um grito silencioso no meio da bolsa de valores de São Paulo. Não vale nada! A degradação do homem é gigantesca! O mundo está se dopando e engordando. A maioria das pessoas saíram de uma peça do Beckett. As poucas pessoas que tomam consciência da merda que é essa condição de vida que a maioria leva escrevem "Não consegui cuidar de meus filhos!" ou "Não consigo arrumar um emprego que gosto!" ou "Sou professor, mas me tratam como um saco de lixo feito para bater!" ou "Minha mulher é frígida!" ou "Essa geração perdeu toda a imaginação!" ou... ou... Tudo acaba na máxima de "O que hei de fazer?" Qualquer coisa que você colocar aí funciona. Dá vontade de ser cego para não ver tanta merda. Ou de ser surdo para não escutar tanta babaquice. Ou ser mudo e não falar mais bosta ainda. Ou ser paralítico e não conseguir ir até o McDonalds engordar.
Essa família que se suicidou antes mesmo da sexta-feira passada, deve ter tido momentos tristes e difíceis. Muitos estão cagando para eles, o que tem a sua razão, porém hoje, no humor que estou, dei atenção sim. Esse cara teve peito suficiente para se revoltar contra esse jogo cruel que virou nossa semi-vida. Ele poderia ter matado alguém, mas ele não fez isso. Ele se prostituiria se fizesse isso, se tornaria os cachorros, ou melhor, nestes cavalos que fazem isso não só com ele, mas com milhões de brasileiros. No meio de tudo isso que esse país se tornou, a atitude dessa família foi um tapa contra todos. Como bons revoltados não receberam louros, não mudaram a vida da humanidade. Fizeram uma batalha no silêncio e tomaram uma decisão que talvez muitos já tomaram. O que passou na cabeça daquele homem? Não porque ele se matou. Isso é óbvio, há inúmeras respostas para isso e todas com suas razões admissíveis. É mais fácil achar mil motivos para morrer do que um para viver. Digo o que se passou na sua cabeça no ato: na hora de botar o veneno na comida, ou no leite, suco, sei lá. E na hora de todos ingerirem o veneno, o que passou quando ele fez isso com seus dois filhos? A sua mulher? E ele?
Isso não sai da minha cabeça.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

a casa queimada

No auge do sono um calor tomou conta de meu corpo. Pingava a suor. Delirava dentro daquele sonho que era o mais colorido e alto de todos. Quando estava mais alto que acima do além, naquele calor gostoso, acordei com o corpo em perigo: minha cama estava em chamas. Em um átimo de tempo estava ereto na cama olhando as chamas se espalharem da minha cama até as paredes. Parecia que o fogo iria me abraçar a qualquer momento num movimento de turbilhão. O desespero só não fez meu coração parar, pois percebi que minha roupa estava totalmente encharcada de água. Eu simplesmente pingava a água. Secava os olhos para poder ver melhor aquele pequeno inferno íntimo. Não havia mais armário e nem escrivaninha. Era somente a cama-fogareiro e eu. Corri em direção a janela e pulei. Mesmo cortando o braço direito e sangrando muito, não havia dor. Estava elétrico por demais. Via a minha casa, que conhecia tanto pegando fogo. "Como pode acontecer isso?" Aquela imensa fogueira não me passava a dor de perder tudo, mas sim o estranhamento de que ela estava, em si, pegando fogo. Tratava a casa como algo vivo. Pulsante por si e em si. Mas nunca como autodestrutiva. Fui andando para trás sem perder os olhos da casa. O fogo era lindo. Cada labareda me lembrava um abraço de amor: quente e perigoso. No meio da hipnose do fogo uma das minhas agulhas se mexeu em meu peito. Gritei. O som não saiu. Tentei gritar de novo e nada. Silêncio total. Só o movimento do fogo é que fazia som. Virei o corpo no desespero e me petrifiquei. Não havia nada. Tudo havia queimado ao redor da casa, para não dizer até onde a vista alcançava. O chão era carvão moído, escuro e sujo. Notei que já estava seco. Corri. Sem saber pra que ou pra onde, corri. Era como se estivesse de olhos fechados. O chão era extremamente plano, não havia nada. O céu estrelado me abafava. Depois de muito correr cheguei em outra casa pegando fogo. "É a minha casa?" Pensei. "É!" Voltei correndo. Depois de um tempo cheguei a minha casa de novo. Corri para outra direção. Depois outra e outra. Mais uma. Corria reto, dobrava para a direita em um determinado momento. Andava de costas. Girava em torno de meu eixo e tonto corria. Nada. Sempre voltava para a minha casa. Minha roupa estava suja. Eu estava fedendo. Cansado resolvi entrar em minha casa. Tudo queimado. Cinzas e mais cinzas. Não havia janelas nem portas. O cheiro era horrível. Imóvel fiquei durante um tempo. Não passou nada pela minha cabeça. Olhei para cima. O céu estrelado continuava lá. Havia muitas estrelas. Era visto a mancha da Via Láctea. Era uma cúpula enorme na minha cabeça. Fazia frio agora. Tinha sido uma noite muito longa. Fechei os olhos de saudade e ao abrir de novo vi a chave pendurada na parede. Estava limpa e ainda dourada. Peguei ela. Senti tanto afeto pela chave que a apertei na minha mão. Apertei tão forte que só parei quando o vermelho de sangue pingou no preto do chão.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

o dia amarelo-cagado

Levantei a cabeça num susto. Nem parecia que pesava dez quilos de estresse autêntico. O relógio não havia despertado desta vez. Era feriado e a droga do tal do relógio biológico havia me acordado de supetão. Levantei sem saber onde estava as pernas e despreocupado com o café. A dor de cabeça já se fazia presente, o diacho de ficar pensando em 'os-ques-dos-fazeres' antes de dormir e trabalhar nos próprios sonhos. Meio zumbi e meio descrente fui em direção a sala. Não me lembro do que aconteceu. Quando sai da percepção sonolenta de mundo, no caso, quando de fato acordei, estava na rua andando. Dia amarelo-cagado, meio de porre de tanto serviço feito e a fazer, eu era um solado cortante de trompete rasgando a vida. Minha própria vida.
Quando de súbito a consciência me veio estava andando perto da praça de casa. O estranho é que eu andava com uma bola de basquete na mão. Uma bola verde e amarela que me lembrava da bandeira brasileira. "Já não basta esse dia amarelo-cagado, tem essa porra de bola de basquete na minha mão!" Minha indignação que durou o tempo deste pensamento não precisa ser comentada. O que posso dizer é que o dia estava amarelo-cagado mesmo. Tudo parecia uma fotografia gasta do início do século, porém só na cor. A arquitetura e os carros eram desta era de 'progresso' mesmo. Parecia que uma tempestade de areia tinha passado por ali, deixando tudo com um tom de amarelo... amarelo... cagado mesmo. Não tem outro adjetivo pra usar. O estranho era que não havia ninguém na rua. Ninguém mesmo. Era eu e a bola de basquete.
Joguei basquete na adolescência. Nunca me esforcei pra ser bom nisso. Além de minha estatura não chegar perto nem de vinte centímetros da altura de um armador profissional, a ideia de jogar um esporte estritamente norte-americano não passava pela minha garganta. Era como engolir uma asa de galinha por inteiro nas cores branca, azul e vermelha. Pensamento estranho este. O fato é que piquei a bola por ela ser uma bola. O contato com o chão fez com que ela emitisse um zunido engraçado. Zunido que fez eco na rua vazia. Picava a bola no chão, entre as pernas, na parede de uma casa, no asfalto, na calçada, até na grade piquei a bola que sempre retornava para as minhas mãos. Pensei num momento que pudesse picar a bola no céu que ela voltaria para mim sem esforço algum. Senti-me rei daquela brincadeira. "Até que enfim algo que sou bom em fazer!" Descartei este pensamento logo depois por pura pena de mim mesmo. Minha decadência é infantil por demais. Mais que aquelas duas meninas que corriam do outro lado da praça. Opá! Lembrei das duas meninas sim! Corriam como se estivesse atrás de um avião que passasse no céu de cor amarelo-cagado. Desviei o olhar quando vi a tabela de basquete. "Quem sabe eu faço uma cesta?" Pensei com meus botões num "lápis" de pensamento. Porém, queria acertar da calçada e atrás da tabela. Impossível acertar claro. Ainda mais com aquela distância. O que seria? Uns seis metros? Não sei, nunca tentei aprender a calcular o espaço que estou. Mas como não havia perdido um quique da bola ainda, acertaria na mosca como um bom Rei que estava naquele dia. Arremessei a bola e ela foi parar no meio da quadra. Me assustei de novo. A quadra de basquete era de grama verde-musgo e estava alagada. A bola havia caído no meio da quadra e feito um "splash" alto, como quando se pula de bombinha na piscina. Fui até a beirada da quadra. Olhei aquela bola amarela e verde boiando no meio da quadra. "Merda!" Falei. Não queria entrar para não molhar os tênis e as calças. Mesmo não pensando no surrealismo daquele momento e tendo negado calcular qualquer espaço concreto em toda a minha vida, chutei por intuição que a profundidade da água daria na minha canela.
No que pensava como pegar a bola, aquelas duas meninas que corriam do outro lado da praça apareceram. Entraram dentro da quadra e se atiraram na água. Brincavam de lutinha. O estranho é que apenas uma delas me chamou a atenção. Posso dizer que a que eu desprezei era um vulto cabeludo vestido de preto. A outra menina não. Pele branca, usava um vestido xadrez de marrom e preto e branco. Por feio que pareça era bonito. Usava um shortinho preto por baixo. Pés nus para entortar a cabeça. Quando rolava pela quadra de água, suas pernas se mostravam. Nada passava pela minha cabeça que não fosse olhar aquelas pernas brancas. Um desejo de lamber ou apertar aquelas pernas nasceu em mim. Todo o meu corpo foi tomado pelo erotismo daquele corpo em desenvolvimento. Aquela inocência quase me fez chorar de tanta beleza. Queria tocar nela, abraçar, sentir o cheiro de seus braços, de seu pescoço, a saboneteira! Sim, a saboneteira! Aquele desejou se transformou em um nervosismo incontrolável quando ela veio em minha direção trazendo a bola de basquete. "É sua?" Que voz doce!"Obrigado." Respondi compenetrado no rosto dela. Paralisei como no mito antigo. Virei pedra de cordilheira, lá no alto. Ela parecia se desgrudar de tudo o que estava na volta. Sua figura se destacava de todo aquele ar amarela-cagado que o dia estava. Quando olhei seus lábios carnudos e vermelhos-saúde, eu, que era solado cortante de trompete, me vi em nota uníssona de oboé acima do vento.
Lembro que andamos por aí. Não recordo do que falamos. Tudo era motivo para eu olhar sua boca. O tom de sua voz, a curva do maxilar, os fios de cabelos que faziam o contorno da orelha num dos detalhes mais sensuais dela. As mão macias que ousei tocar na hora de pegar a bola e de fazer com que ela a pegasse de volta na hora de amarrar meus tênis, mesmo estando amarrados. A inocência dela estava se voltando para mim. Depois de um outro sorriso dela nos deparamos em frente a minha casa. Era um restaurante. Me lembrei que morava em cima de um restaurante. Convidei ela para entrar. Ela entrou. Me lembro da expressão de seu rosto estranhando o ambiente. "Moro no andar de cima." Ela sorriu dizendo telepaticamente que agora fazia sentido. Antes de convidá-la para subir me abraçou forte. Seus lábios encostaram em minha bochecha. E os meus perto da orelha em direção ao pescoço. Apertei suas primeiras costelas, dois dedos abaixo daqueles pequenos seios, na altura do seu diafragma. É ali que gosto de apertar. Ela se soltou. "Ainda não." E sorriu. Me deu outro beijo no rosto e disse algo que me surpreendeu. "Te amo. Você me fez preferir está com você do que com a minha família." E saiu em direção a porta. A vi andando rápido pela janela. O dia ainda estava amarelo-cagado. Tudo no restaurante estava verde e vermelho. Imaginei ela nua em uma das mesas. Não havia ninguém no restaurante.Peguei a direção para subir a escada que dava em direção de onde morava. Não havia degraus. Ainda embriagado tive que escalar a parede para chegar a porta de meu apartamento. 

domingo, 1 de setembro de 2013

Madame Gwen e seus gatos

Estava almoçando na casa de Madame Gwen. Comíamos no quintal de sua casa, muito bonito o lugar. Todo madeirado, sabe? Tipo cabana, tipo inveja pra qualquer um. Sem falar que havia comida suficiente para umas dez pessoas, mas tinha em torno de cinco, não lembro. Estava gostando muito purê de batata, muito mesmo. Até que Madame Gwen escutou um barulho vindo da cozinha. Ela falou que era o gato do vizinho tentando entrar na casa pela janela da cozinha. Pediu, com educação elevada, para mim fechar a janela. No mesmo tom não recusei. 
A janela era toda dourada e um pouco estranha. Ela abria para baixo, de uma forma que a parte de cima da janela estava aberta. E o gato do vizinho estava de pendurado nela. Gato grande, bem alaranjado-dourado, acho que os olhos eram laranjas também. Lindo. Mas o filho da puta estava entrando. Usando uma vassoura bate no focinho do gato até ele largar a janela. Caiu para o lado de fora da casa. Olhei ele resmungar alguma coisa. Larguei a vassoura e me concentrei na janela de novo. Não havia jeito de fechar aquela puta. "Esta janela é muito estranha, não consigo fechar!" Gritei para Madame Gwen. Ela disse que era só levantar o vidro e fechar os pinos da ponta. Era de longe a janela mais estranha do mundo.  E quando eu já estava suando de tanto trabalho a porra do gato apareceu de novo. Peguei a vassoura e quase quebrei o cabo batendo na cabeça daquele lindo gato do vizinho. Ela não conseguiu entrar. Nervoso fui pra rua chamar Madame Gwen. Expliquei o que havia acontecido. Na volta pra cozinha, vi o gato entrando pela janela e correndo para o interior da casa. "Filho da mãe!" Pensei na hora. "Ele entrou Madame Gwen!", disse para a dona da casa. Ela, numa resposta rápida e quase que automática disse: "Pegue-o!"
Não sou um apaixonado por gatos. Fiquei com medo que o gato pudesse ficar com algum remorso e querer me atacar pelas porradas que tinha lhe dado. Para me proteger da missão peguei a vassoura-amiga para ir atrás do lindo gato do vizinho. Entrei no quarto. Devagar, bem devagar, olhei para todos os cantos, com o cabo da vassoura levantei o lençol e... nada. O gato não estava ali. Fui para o banheiro. Lugar pequeno, não teria como um gato se esconder ou fazer qualquer coisa ali. Mas estava sim um gato, porém outro. No box! Um gato cinza-branco-sujo-meio-perebento. Parado me olhando. Gritei: "Madame Gwen tem um gato cinza aqui no banheiro!" Ela respondeu dizendo que aquele gato era dela. Bom, então não era este que eu teria que espantar. Fui para a sala. Lá encontrei outros três gatos. Agora cada um com uma cor diferente, mas mantendo o tom de branco e cinza sujo. Eram gatos feios.
- Madame Gwen! Tem mais três gatos aqui na sala. Nenhum deles é o laranja do vizinho!
- São meus também!
Surpreso pela resposta lancei uma pergunta:
- Afinal, quantos gatos a senhora possui?
- 14!
No que foi dada a informação de Madame Gwen, os outros 11 gatos apareceram na sala. Todos os 14 estavam lá, todos branco-cinza-sujos e feios. Andando em minha volta. Dois fizeram carinho em minhas pernas. Eu me espantei com tantos gatos ao mesmo tempo. Andando em minha volta. Começaram a fazer carinho em mim. Alguns mais ousados queriam subir em mim. Arranhavam a minha perna. Miavam. Fiquei mudo de medo. Imóvel pela surrealidade da situação. Os gatos começavam a subir pelas minhas pernas. Então comecei a bater nos gatos tentando me livrar deles. Quando jogava um gato ao longe de mim, um outro me arranhava o braço, ou a barriga, ou pulava em meu rosto. Era um ataque de 14 gatos que  ronronavam sem parar. 
Em meio aquele desespero que crescia, olhei para a janela da sala e vi aquele lindo gato alaranjado-dourado na janela, mas pelo lado de fora. Me olhava. Não aparentava expressão alguma.